domingo, 12 de abril de 2015

‘Se não crescermos 4% ao ano, não vejo perspectiva’, diz presidente da Frente Nacional de Prefeitos

 Para Lacerda, que também é prefeito de Belo Horizonte, os municípios não têm recursos para subsidiar tarifas de transporte
 Por: Ilana Almeida


dinheiroO novo presidente da Frente Nacional de Prefeitos, Marcio Lacerda (PSB), diz que, se a economia do país não melhorar, não há salvação para a “penúria financeira” dos municípios brasileiros, que cada vez têm mais atribuições. Para Lacerda, que também é prefeito de Belo Horizonte, os municípios não têm recursos para subsidiar tarifas de transporte.
O GLOBO: A presidente Dilma Rousseff, em reunião esta semana com os prefeitos, avisou que o contingenciamento do Orçamento da União será grande.
Marcio Lacerda – Isso não é novidade. No ano passado, em um congresso da Associação Mineira de Municípios, levei um recorte detalhado do orçamento federal para 2014, mostrando a baixíssima margem de manobra que o governo federal tinha para aumentar os repasses para as cidades. Se o país não voltar a crescer a uma taxa média de 4% ao ano, em um processo continuado e sustentável, eu não vejo perspectiva de melhoria nessa penúria financeira que os municípios vivem e que já vem de muito tempo.
A que se deve esse quadro?
A principal queixa é a concentração da renda tributária nas mãos do governo federal, e a passagem cada vez mais frequente de atribuições para os municípios sem a definição da fonte de recursos. O governo federal repassa recursos para construir escolas e unidades de saúde, mas os municípios não têm verba para a manutenção dessas unidades. Inclusive agora, com a alocação de recursos do pré-sal para saúde e educação, coloca-se uma situação nova. Muitos municípios, se quiserem alocar esses recursos para pagar melhor seus professores, estarão rompendo o limite de comprometimento da receita com a folha de pagamento.
Ou seja, o Executivo toma decisões que têm impacto nos orçamentos municipais.
Muitas vezes o governo federal estabelece aumento do piso salarial de categorias, diminuição de carga horária de 40 para 30 horas. Isso tem impacto nas finanças municipais, e essas determinações não vêm acompanhadas da explicação de qual seria a fonte de recursos.
Na esteira das manifestações de 2013, o governo federal prometeu investimentos em mobilidade urbana. O que foi feito?
Cidades que tiveram os investimentos amarrados com a Copa avançaram bastante. Já no caso dos investimentos anunciados pela presidente Dilma em 2013, que a gente até apelidou de “os R$ 50 bi da Dilma”, projetos foram feitos, mas a alocação desses recursos segue em marcha muito lenta. Isso é agravado pela dificuldade do orçamento federal.
E a discussão sobre a tarifa do transporte público?
Quanto ao debate sobre subsídio de tarifa, as prefeituras não têm recursos. Há prefeituras, como a de São Paulo, que já despendem recursos na casa de bilhão de reais, que é o caso do Rio também. Em cidades como São Paulo, metade ou mais das passagens são bancadas pelo vale-transporte, em geral pagos pelas empresas. Pessoalmente, defendo que, se o subsídio existisse, deveria ser para quem tem renda baixa, seria uma tarifa social, um cartão. A questão é definir quem paga isso, se é a própria tarifa, se é subsídio. O ministro da Fazenda (Joaquim Levy) declarou que, em princípio, é contra subsídio. Ele é a favor de investimento para melhorar a qualidade do transporte.
O senhor veio da iniciativa privada. Vê muitos entraves na máquina pública?
As regras de funcionamento do serviço público tornam o processo decisório muito lento. No setor privado, você pode fazer tudo o que a lei não proíbe. No setor público, você só pode fazer aquilo que é regulamentado por lei. A interpretação da legislação muitas vezes é confusa. A área ambiental é um desastre na questão da legislação, a subjetividade campeia. As pessoas acabam ficando com medo de tomar decisões. Ficam em cima de pareceres jurídicos, com receio de uma ação do Ministério Público.
Mesmo com esses controles, a gente acompanha agora escândalos como o da Petrobras e o do metrô de São Paulo.
O problema maior do país é a impunidade. Felizmente, temos uma Polícia Federal e uma Justiça independentes, e, à medida que se mostrar que a elite também pode ir para a cadeia, a corrupção tende a diminuir.
A que o senhor atribui a derrota do senador Aécio Neves (PSDB-MG) em Minas na disputa pela presidência da República?
A um desgaste natural de 12 anos de governo e a uma escolha inadequada de candidato ao governo. O fato de esse candidato (Pimenta da Veiga, do PSDB) ter sido derrotado no primeiro turno levou a maioria das pequenas cidades a trabalhar por uma vitória do PT para presidente, para não se expor, no julgamento deles, a retaliações do governo estadual (do PT). Outro elemento foi a imensa dependência de recursos federais das pessoas mais excluídas, das cidades menores, e da forma como a campanha (de Dilma) foi feita, colocando medo nessas pessoas de perderem esses recursos.
Se o senhor tivesse sido candidato o resultado teria sido diferente?
Muita gente fala isso (rindo). Eu digo que esse tipo de avaliação é complicado, né?
O governador Fernando Pimentel (PT) questiona o choque de gestão em Minas, e o PSDB diz que ele tenta desviar a atenção porque não pode cumprir o que prometeu.
Tem muitas meias verdades. O choque de gestão eu vivi de dentro porque fui secretário de Desenvolvimento do Aécio. Se você analisar os indicadores, vai ver que o estado avançou muito, não só na economia, mas também nos processos de gestão. Eu diria que esse processo se perdeu um pouco nos últimos anos, devido a questões políticas e pelo próprio desgaste de 12 anos de governo, mas as conquistas são concretas, não tanto quanto poderiam ter sido, mais houve avanços.
As reclamações procedem?
O PT de fato herda um governo, do ponto de vista das finanças, bastante fragilizado. Assim como aconteceu com o governo federal, a queda de arrecadação lá foi brutal, principalmente pela queda do preço das commodities e pelo esfriamento da economia. Pimentel está assumindo sem margem de manobra do ponto de vista de investimentos, de cumprir as promessas de campanha, de aumento de salários e obras, mas ele provavelmente sabia disso.
O Globo

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